Nosso espetáculo tem a pretensiosa vontade de narrar a saga da aventura humana. Para contar esta história, utilizamos três prismas diferentes e simultaneamente unos, a saber:
1) o desenvolvimento do ser humano como ser social em sua saga histórica;
2) a construção da cidade como fruto e estímulo da ação do ser social;
3) a formação da consciência do indivíduo como apreensão particular do ser social;
Junto disso cabe a reflexão sobre a construção do herói e as grupalizações humanas que criam a figura do líder.
O primeiro ato que traz consigo um apêndice, um prólogo alerta aos viajantes, versa sobre o movimento do ser social construtor de história, da cidade, do capital. Esse movimento passa pelo deslocamento/migração, aglomeração no espaço urbano, industrialização (automotiva, construção civil) e favelização. No seio desse deslocamento opera a ideologia que tenta pinçar a idéia de herói na figura dos escolhidos que são exemplo da funcionalidade do sistema. Um sistema hierárquico onde a perseverança, a resignação, a força de vontade, a competência individual, a competitividade, a rejeição do erro dentre tantas outras idéias são postas como características naturais e quando não como ideais de busca individual. Apresentar esse sistema é uma das tarefas da encenação do primeiro ato, apresentar as estruturas da construção da cidade é outra.
Esta é a apresentação do intenso movimento de inúmeros personagens reprodutores da vida e que na somatória de suas experiências alienadas, sem se darem conta, constroem a cidade, a sociedade e a história.
O segundo ato divide o público em dois grupos. A cisão dá-se de forma brusca. Num lado, o refugo humano vítima do despejo de uma favela; noutro, o seleto grupo de possíveis compradores de apartamentos de luxo em região nobre da cidade.
Os despejados ficarão em céu aberto e os privilegiados no conforto das poltronas dentro da sala de apresentações. Nestes contextos aprofundamos as contradições da sociedade espetacularizada, em meio a luta de classes, em duas abordagens:
1) As grupalizações que reproduzem o ideário dominante sem a clara percepção de que o fazem.
2) O asfixiante universo do indivíduo atomizado e consumidor das benesses e fetiches capitalistas.
A trajetória humana apresentada aparentemente redunda num circuito fechado onde não há espaço para a transformação da vida social. O ciclo perfeito se rompe justo pela imperfeição e a novidade das relações sociais que reproduzem um modo/sistema, mas carregam consigo a imperfeição e a impossibilidade da exata repetição dos eventos. , Entendemos imperfeição ou erro ou falta como virtude capaz de por em cheque todo e qualquer sistema que busca a perfeição na reprodução de sua própria existência.
Soma-se a este esquema a tentativa de grupos humanos de analisar a realidade social e projetar caminhos para a transformação da realidade. A festa, ou terceiro ato, traz a possibilidade de quebra de alguns padrões e em posse de parcial liberdade, pois, mesmo aí a determinação social opera, experimentamos a bruma de um porvir, o projeto de sociedade descolado das cercas da ideologia dominante. A mesma festa é apresentada como o mergulho coletivo nas entranhas da sociedade do espetáculo.
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